A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) decidiu nesta terça-feira (15) que o novo empréstimo ao setor elétrico para cobrir os custos da crise energética do ano passado será de até R$ 10,5 bilhões, dividido em duas partes.
O dinheiro será levantado junto a bancos públicos e privados. O financiamento, com cobrança de juros, será pago pelos consumidores de energia através de um novo encargo aplicado à conta de luz a partir de 2023.
A primeira parte do empréstimo foi regulamentada nesta terça e será de até R$ 5,3 bilhões, à vista. O valor deverá cobrir:
O saldo negativo das bandeiras tarifárias que não arrecadaram o suficiente (R$ 540 milhões);
O custo do bônus pago aos consumidores que economizaram energia no fim do ano passado (R$ 1,68 bilhão),
A postergação de cobranças pelas distribuidoras (R$ 2,33 bilhões); e
A importação de energia, entre julho e agosto do ano passado (R$ 790 milhões).
Já a segunda parte – estimada, até o momento, em outros R$ 5,2 bilhões – será para cobrir parte do custo da contratação emergencial de energia, realizada em leilão simplificado no ano passado e com período de fornecimento a partir de 1º de maio deste ano.
A segunda parte do empréstimo, porém, ainda será avaliada pela agência e passará por consulta pública. Não há previsão de quando isso ocorrerá.
Consumidor paga
O prazo total do financiamento e a taxa de juros ainda serão definidos junto aos bancos que vão emprestar o dinheiro. A previsão da Aneel é que a operação saia até a primeira quinzena de abril.
O financiamento será direcionado às distribuidoras de energia porque elas são consideradas o “caixa” do setor elétrico, ou seja, arrecadam os valores junto aos consumidores através da conta de luz e pagam os geradores e transmissores de energia.
Uma medida provisória e um decreto editados pelo governo deram suporte legal ao novo empréstimo ao setor elétrico. Somente a regulamentação ficou a cargo da Aneel.
O objetivo do governo com o empréstimo é diluir ao longo do tempo o custo ainda não pago da crise energética de 2021.
Na prática, o empréstimo dilui o pagamento dos custo adicional gerado pela escassez hídrica do ano passado, ou seja, evita que a cobrança se concentre nas contas de luz em 2022, nos reajustes tarifários anuais das distribuidoras.
Apesar de permitir o parcelamento desse custo a partir de 2023, o empréstimo implica na cobrança de juros, o que significa que, ao final do empréstimo, os consumidores terão pago um valor mais alto.
Equilíbrio
A medida também visa garantir o equilíbrio econômico-financeiro das distribuidoras de energia, que alegam “carregar os custos” das medidas adicionais adotadas durante a situação de escassez hídrica.
“Os custos para enfrentamento da crise hídrica aumentaram significativamente no segundo semestre [de 2021], abrindo um fosso entre as despesas que as distribuidoras tinham para enfrentamento dessa crise e a cobertura tarifária, mesmo com a bandeira tarifária”, afirmou Ricardo Brandão, diretor regulatório da Associação Brasileira das Distribuidoras de Energia Elétrica (Abradee).
Segundo Brandão, a medida é importante tanto para as distribuidoras quanto para os consumidores.
“Não é desejável que se tenha uma volatilidade tão grande da tarifa, então um programa como esse, que suaviza essa curva, é benéfico tanto para as distribuidoras quanto para os consumidores.”
Outros empréstimos
Em 2014, o governo Dilma Rousseff também recorreu ao mecanismo de emprestar dinheiro ao setor elétrico para segurar o reajuste imediato na conta de luz. O empréstimo foi de R$ 34 bilhões, operação que ficou conhecida como “Conta-ACR”, encargo que também foi cobrado dos consumidores na conta de luz. Dos R$ 34 bilhões, R$ 12,8 bilhões foram juros pagos aos bancos.
Já em 2020, um novo empréstimo foi feito para socorrer o setor elétrico dos efeitos da pandemia de Covid-19. Cerca de 60 distribuidoras aderiram ao financiamento, que totalizou R$ 14,8 bilhões.
O valor está sendo pago pelos consumidores, através de um encargo embutido na conta de luz. As parcelas da chamada “Conta Covid” serão cobradas mensalmente até dezembro de 2025. A taxa de juros total da operação foi de 3,79% + CDI (Certificado de Depósito Interbancário, que acompanha a taxa Selic).
O coordenador do Programa de Energia e Sustentabilidade do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Anton Schwyter, critica os sucessivos empréstimos ao setor.
“O fato é que esses empréstimos não resolvem problemas estruturais e conjunturais, pelo contrário, eles contribuem para ampliação dos custos finais aos consumidores devido à incidência de juros”, diz Schwyter.
O diretor da Aneel Efrain Cruz, relator do processo que trata do novo empréstimo, afirmou que a medida foi a “possível”.
“Talvez não seja a solução 100% do setor elétrico, mas é o que temos para o momento. É uma estruturação de uma conta que ainda o Brasil vai experimentar tarifas elevadas, mas foi o mecanismo possível”, afirmou